segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Como um centésimo pode mudar a história!!!

Na história da natação, são notórios os casos de vitórias por um centésimo que entraram para a posteridade. E não raro os protagonistas têm suas vidas radicalmente modificadas por causa dessa fração de segundo.

Em 1988, o surinamês Anthony Nesty superou o favorito americano Matt Biondi na final dos 100m borboleta nas Olimpíadas de Seul pela diferença mínima. É até hoje o único atleta de seu país a subir no lugar mais alto do pódio olímpico, e também o único negro a conquistar um ouro individual na natação.

O americano Gary Hall Jr venceu os 50m livre sobre o croata Duje Draganja por um centésimo em 2004, e quatro anos antes havia empatado na primeira colocação com o compatriota Anthony Ervin! Em ambas as situações, uma unha mais curta e ele poderia não ter nenhum ouro olímpico individual.

O caso mais recente é a vitória de Michael Phelps sobre Mirolad Cavic nos 100m borboleta em Pequim/2008. Tivesse o americano ficado com a prata, ele não teria superado a performance de Mark Spitz de sete ouros de 1972, e talvez ainda não seria considerado o maior da história (para muitos, vale mais disputar sete provas e ganhar todas do que disputar oito e perder uma).

Mas famos falar aqui de um caso no qual um centésimo poderia ter mudado radicalmente a situação da nossa natação nos dias de hoje.

No Mundial de Melbourne, em 2007, César Cielo surpreendeu ao assumir a ponta na primeira metade na final dos 100m livre, nadando na raia 1, na frente de favoritos como Filippo Magnini, Pieter Hoogenband e Roland Schoeman. Manteve a liderança até 15 metros para o final, mas ficou fora do pódio por quatro centésimos. O Brasil não conquistava medalhas em Mundiais de longa fazia 13 anos, e nesse período jamais havia chegado tão perto.

A decepção de Cielo após a prova era evidente. O fato fez com que ele criasse uma pressão sobre si próprio para os 50m livre, sua melhor prova. Se ficou em quarto nos 100m, poderia fazer melhor na prova mais curta. Mas, apesar de ter batido o recorde sul-americano na semifinal, não nadou bem a final, fruto dessa pressão interna. Afinal, após ter passado tão perto nos 100m, era sua última chance real de medalha. Após a prova, sentido, desabou em lágrimas ainda na piscina (foto abaixo).

Por pouco, a mesma história não se repetiu nas Olimpíadas de Pequim, em 2008. Cielo iniciou sua participação abrindo o revezamento 4x100m livre para 47.91. Um ótimo tempo, melhorando seu recorde sul-americano e nadando pela primeira vez na casa dos 47s. Mas na final da mesma prova, nada menos que quatro nadadores abriram o revezamento com tempos melhores que o do brasileiro. Para conquistar uma medalha nos 100m livre, estava claro que ele precisaria mostrar algo a mais.

Na semifinal da prova individual, Cielo terminou na quinta posição na primeira série. Depois de nadar, deu entrevista chorando para a televisão, já se considerando fora da final, dizendo que a partir dali era se concentrar para os 50m.

No entanto, na segunda semifinal, favoritos como o italiano Filippo Magnini e o canadense Brent Hayden (então campeões mundiais) não nadaram bem e Cielo entrou entre os 8. Na final, a exemplo do Mundial de Melbourne, mostrou personalidade e passou a primeira metade na terceira posição. Ao contrário do que vinha acontecendo na eliminatória e na semifinal, manteve a posição e conseguiu um bronze chorado. Chorado porque o americano Jason Lezak veio em sua busca nos últimos 50m, mas não o suficiente para ultrapassá-lo - na realidade, somente para chegar junto. Os dois empataram com a marca de 47.67 e dividiram o terceiro lugar (abaixo, sua reação ao ver o resultado no placar).

Agora imaginem um outro cenário, diferente por apenas uma fração de segundo, mas que poderia trazer consequências drásticas. Suponham que Cielo tivesse nadado um centésimo mais lento. Ele terminaria na quarta posição, sem medalha. Novamente um quarto lugar, raspando no bronze. O fantasma do Mundial de Melbourne voltaria a assombrá-lo. Para ele, os 50m seria a última chance de medalha. Como ele se comportaria? A pressão interna gerada seria até maior do que a de 2007 na Austrália.

Mais relaxado após o bronze, o que vimos depois daquilo foi o Cielo que conhecemos hoje. Bateu três vezes o recorde olímpico dos 50m para conquistar a primeira medalha de ouro da história olímpica da natação brasileira. E dali partiu para vôos ainda mais altos.

Não é a toa que ele próprio considera sua medalha mais importante aquele bronze nos 100m livre. Foi a transformação de menino em homem. Se a medalha não tivesse saído, talvez a dos 50m também não tivesse acontecido. O caso emblemático foi o do australiano Eamon Sullivan: recordista mundial dos 50m e 100m livre, perdeu o ouro nos 100m para o francês Alain Bernard após ter feito um incrível 47.05 na semifinal da prova. Isso o estraçalhou emocionalmente. Consequência: nos 50m, favoritíssimo, não foi nem sombra do recordista mundial que era e sequer conseguiu medalha. Pelo contrário, o bronze de Cielo o fortaleceu mentalmente para ir em busca da vitória nos 50m.

Por isso, o centésimo que poderia ter feito Cielo ter perdido o bronze nos 100m livre não mudou apenas a vida dele: mudou a história da natação brasileira.



Autor: dtakata

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